Na região do Alto Chicapa, entre os anos de 1972 e 1974, a morte era encarada pelo povo como a passagem de um indivíduo a um estado de espírito.
Sem saber o que estava a acontecer e sem estar muito à vontade, assisti a parte de um ritual funerário. Perante o meu pouco à vontade, tranquilizaram-me dizendo que era uma cerimónia necessária para o morto ficar sossegado, além-túmulo.
Quando não o faziam, acreditavam que uma grande inquietação angustiosa se apoderava do espírito do falecido exercendo uma influência nefasta sobre todos, sobre a aldeia e principalmente naqueles a quem competia terem feito a cerimónia, a família.
Consistia, quase sempre, em batuques ruidosos, onde o choro e o carpir andava de mãos dadas com o som dos tchinguvos, com comezainas, mais ou menos fartas conforme as posses e a importância do morto, e… em libações descontroladas, que me assustaram!
Estes rituais, que duravam uma ou duas noites, acabavam no dia do enterro.
Como sempre o fazia noutros casos, confirmei com o Sá Moço alguns dos acontecimentos passados naquela noite. Devido ao meu interesse, acabou por me contar alguns episódios passados com a morte de um Soba, onde era tudo muito complicado, mais demorado e extravagante.
Contou-me, que o falecido ficava em casa durante cinco dias, guardado por vários homens e só ao sexto dia era enterrado. Durante esses dias havia batuques, sem parar, matavam-se cabras, porcos, galinhas e até bois… a cerimónia deveria ser muito digna.
Ao sexto dia, depois do enterro, a sua casa era queimada e alguns dos seus bens eram destruídos. O povo, sempre com muito medo da morte e de um contágio generalizado, mudava-se para um outro local para construir uma nova aldeia.
Uma outra observação, espontânea, extremamente curiosa, aliás, frequente no Sá Moço, quando estava confiante e liberto de medos, referia-se ao costume contado pelos mais velhos, de sepultarem os Sobas com uma das suas mulheres… acreditavam que a vida terrestre se prolongava após a morte e que todo o defunto mantinha a sua situação social ocupada em vida.
A seguir - O fim do luto
Carlos Alberto Santos